Por: Magda Suzana da Silva
Ferreira
Laura dos Santos Lunardi
Este artigo discorre sobre as
atribuições do serviço social, contextualizando-as à luz das transformações na
dinâmica dos serviços de saúde propostas pela Reforma Sanitária brasileira.
Descreve as características de um processo de assistência voltado à
integralidade do usuário, enumerando ainda as diversas atividades destinadas a
implementar tal prática.
A doença normalmente causa rupturas na
organização familiar. Nos casos graves, que requerem hospitalização, observa-se
ser este um momento difícil tanto para o paciente quanto para seus familiares.
A enfermidade altera a realidade, provocando impacto no cotidiano da família e
obrigando-a, entre outras coisas, a adaptar-se às regras institucionais.
O trabalho com
pessoas hospitalizadas e seus familiares torna visível à vulnerabilidade que
acomete todos os que passam por essa situação, mostrando a importância da luta
pela humanização do atendimento. Isso fica ainda mais evidenciado quando se
considera que, além de estarem vivendo um momento de fragilidade e ansiedade
devido à enfermidade, muitas pessoas têm seu sofrimento agravado por
desconhecerem seus direitos de cidadania.
Segundo IAMAMOTO
pode-se verificar ser de suma importância para os assistentes sociais, em
qualquer âmbito de atuação, captar as novas mediações e requalificar o fazer
profissional, atribuindo-lhe particularidades e descobrindo alternativas de
ação. A autora afirma que um dos maiores desafios atualmente enfrentados pelo
assistente social é o de desenvolver sua capacidade de decifrar a realidade
para construir propostas de trabalho criativas, capazes de preservar e efetivar
direitos, a partir da demanda emergente no cotidiano. Enfim, ser um
profissional propositivo e não apenas meramente executivo. Os atributos
profissionais do assistente social conferem-lhe competência para propor novas
formas de tratar os problemas, negociar seus projetos com as instituições,
defender o seu campo de trabalho, qualificações e funções profissionais.
Seguindo a
proposição acima, o Serviço Social busca transformar o contexto da atividade
laboral. Para tanto, intervém junto ao usuário no sentido de fortalecer sua
autonomia e informar-lhe sobre seus direitos como cidadão, especialmente no que
tange aos aspectos relacionados à saúde. O trabalho desses profissionais está
voltado à promoção da emancipação do usuário, para que possa ser agente no
processo de mudança de sua própria realidade, transformando-se em partícipe
ativo no controle social. Cabe ainda ao assistente social estimular a
participação do usuário nas comissões de saúde, entre outras ações, capacitando
o indivíduo a ser sujeito no processo de transformação da sociedade, partindo
da conscientização social, ou seja, uma mudança global e não mais individual.
A relação Estado e
sociedade vem se modificando progressivamente na realidade brasileira; no caso
da saúde, em termos de acesso a direitos sociais, há importantes diferenças,
antes e após a Constituição Federal de 1988. O direito à assistência estava
vinculado à contribuição à Previdência Social, excluindo o acesso de todos os
não inseridos no mercado formal de trabalho. Isso, naturalmente, fragilizava
ainda mais as classes populares, já vulneráveis por sua condição econômica e
social.
Na passagem da
década de 1970 para a seguinte, foi possível demarcar o estabelecimento de
novas relações entre o Estado e a sociedade. As desigualdades no acesso à
saúde, a desorganização da Rede, a centralização do processo decisório e a
baixa resolubilidade e produtividade dos recursos existentes, somados à
conjuntura de crise econômica, colocaram em cena novos atores sociais que
passaram a pressionar o Estado por políticas sociais mais equânimes.
No tocante à saúde,
as mudanças introduzidas pela Constituição de 1988 são o resultado da força
organizada do Movimento Sanitário, que emergiu nos anos 1970 por iniciativa de
um grupo de intelectuais, médicos e lideranças políticas do setor saúde,
provenientes, em sua maioria, do Partido Comunista Brasileiro. Esse movimento
deu origem à Reforma Sanitária brasileira, que alterou o panorama da política
social de saúde, hoje configurada como a área que mais sofreu transformações
significativas.
A mudança trazida
pela Constituição e pela Lei 8.080, a chamada 'Lei Orgânica da Saúde', que
definiu a forma de operacionalização do Sistema Único de Saúde (SUS), colocou
em destaque os diversos profissionais que até então permaneciam em posição
secundária. Nessa conjuntura o assistente social passou a ter um papel
mediador no contexto hospitalar, intervindo sobre as tensões, os conflitos, a
violência, entre os grupos excluídos, a sociabilidade local e a sociedade instituída,
sem, contudo, tomar posição por nenhum dos pólos de conflito que fazem
esforços, cada um, para trazer o Serviço Social para seu lado. O Serviço Social
faz, neste sentido, a interligação entre os sistemas-recursos e de poder com os
sistemas-utilização, tendo como a inclusão social dos excluídos pela sociedade
desigual, facilitando a comunicação entre sistemas, principalmente em caso de
dificuldade e de ausência de relações entre os dois sistemas.
Se saúde e doença são percebidas como
aspectos contrários, como pólos opostos do estado físico e psíquico, essa
bipolaridade também está presente no corpo de quem vivencia esses fenômenos:
posto que a doença, para ser entendida, é preciso que a saúde se vá e o
conhecimento [da doença] se torne possível. Como salienta Ribeiro, em citação à
Ariés, a sensação de estar privado da saúde, o temor e a fragilidade que tal
sensação desperta podem desencadear um processo de submissão total do doente ao
hospital, evidenciando uma tentativa de suprimir o mal que o acometeu: o
hospital não é apenas o lugar onde as pessoas se tratam e curam; é também onde
se morre e onde, paradoxalmente, a morte é negada. O mesmo autor, dessa feita
citando Boltanski, afirma, em contraponto a essa assertiva, que os
profissionais de saúde trabalham no sentido de transformar essa realidade de
submissão, por meio de abordagens voltadas à emancipação das pessoas doentes,
entendendo, também, que a doença do doente é do seu organismo total e não a
doença anatômica.
Existem ainda vários
outros fatores inerentes à hospitalização que contribuem para o recrudescimento
de agruras existenciais e de problemas emocionais graves, que atuam de forma
deletéria ao desenvolvimento da pessoa doente e hospitalizada. Dentre esses se
destacam o desmame agressivo; o transtorno da vida familiar; a interrupção ou
retardo da escolaridade, ritmo de vida e desenvolvimento; as carências afetivas
e agressões psicológicas e físicas; despesas elevadas e, ainda, o risco de
variadas iatrogenias, entre as quais a mais significativa se refere às
infecções hospitalares. Em relação a todos esses problemas, a atuação do
assistente social objetiva minimizar o sofrimento inerente ao processo de
doença e hospitalização do doente, incentivando sua família a ser elemento
ativo no processo, condição importante para o êxito do tratamento. A ação
desses profissionais objetiva, também, a promoção da saúde mental integral do
paciente, valorizando influxos satisfatórios entre o mesmo e sua família. A
atuação do Serviço Social visa atender, apoiar, facilitar a compreensão, dar
suporte ao tratamento, auxiliar a entender os sentimentos, prestar
esclarecimento sobre a doença e fortalecer o grupo familiar.
Nesse sentido,
faz-se necessário ressaltar que a presença da família é fundamental, constitui
o referencial do doente, significando afeto e proteção. O elo que os une
contribui para manter ou restaurar o equilíbrio do paciente, pois normalmente
advém das pessoas que lhe transmitem segurança emocional. O contato com as
mesmas ajuda a manter os aspectos sadios de sua existência e seus vínculos com
sua realidade anterior, auxiliando sua adaptação no hospital. A afetuosidade da
relação família/paciente gera um sentimento de apoio.
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